Na recente Cimeira ordinária dos chefes de Estado e de Governo da União Africana, em Adis Abeba, o conceito pan-africanista esteve em voga.
Espaço do Autor Fevereiro 21, 2023
Na recente Cimeira ordinária dos chefes de Estado e de Governo da União Africana, em Adis Abeba, consensualmente tida como realizada num contexto internacional de incertezas, sustentadas por conflitos geopolíticos, governação económica fragmentada, com consequências imprevisíveis para África, designadamente, o aumento da perda de impulso do crescimento económico global e a subida de taxas de inflação, o conceito pan-africanista esteve em voga, quer se queira quer não.

Paulo de Jesus*
O recém-eleito Presidente do órgão directivo da União Africana, o Presidente das Comores, Azali Assoumani, concluiu ser imperativo que os Estados-membros decidam, com determinação, as suas opções económicas e de desenvolvimento.
Como tábua de salvação, Assoumani apontou o caminho da activação de mecanismos de resiliência interna, solidariedade intra-africana, implementação rápida de instituições financeiras africanas, “suportados por uma governação virtuosa”, naquilo que Moussa Faki Mahamat, o actual Presidente da Comissão da União Africana, defende: A necessidade do pan-africanismo dos Estado-membros, evitando o paradigma em que vemos, de braços cruzados, a casa do vizinho arder, contrário “à nossa cultura e menos ainda com a nossa civilização, ambas baseadas na ajuda mútua”.
Exemplificou o choque de realidades dadas hoje pelos países confrontados com o terrorismo, que lutam, muitas vezes sozinhos, perante a indiferença geral. “Onde está o nosso pan-africanismo? Onde está a nossa solidariedade? Onde está nossa irmandade?”, questionou o Presidente da Comissão da União Africana, que pediu ainda a aceleração com determinação do projecto de integração económica, operacionalizando a Zona de Comércio Livre, tema escolhido pela UA para o ano de 2023, assim como a ênfase para o princípio da solução africana dos problemas africanos, “num espírito de solidariedade uns com os outros em tempos de crise”.
Na minha opinião, é desnecessário agora a reformulação teórica e pratica do pan-africanismo, porque as bases fundacionais e a sua matriz tradicional, mesmo embora reinventáveis e mutáveis, se mantém válidas. Basta pintá-las, mas com as mesmas cores africanas.
E respondermos à um pequeno catálogo de perguntas como estas: Como é ser-se pan-africanista hoje? Ou ainda: Como é não se ser pan-africanista num mundo concorrencial e onde persistem enormes desafios para África? Numa conjuntura internacional cheia de reptos para o continente-berço, esse conceito teórico que defende a união de todos os povos africanos como forma de potencializar a sua voz (e a sua força), que se popularizou nas lutas pelas independências dos jugos coloniais e levou mesmo o surgimento da então Organização de Unidade Africana, hoje UA, deve ser revisitado.
Antes, o pan-africanismo propunha a unidade política, social e cultural. Hoje, o essencial não mudou muito, mantendo-se vivos e necessários tais objectivos. Mas há a necessidade de urgência e abrangência nos capítulos de desenvolvimento económico e da capacidade financeira entre os Estados-membros, que rapidamente querem tornar-se mais livres e independentes relativamente aos “sanguessugas” ocidentais.
E o projecto da Zona de Comércio Livre no Continente Africano (ZCLCA) é um exemplo desse desafio pan-africanista.
Como atesta o secretário-geral da iniciativa, Wamkele Mene, “a ZCLCA é um instrumento a ser utilizado pela União Africana para posicionar a África para responder adequadamente aos desafios enfrentados pelo nosso continente, à crise de saúde pública a partir da qual o continente está a emergir e, claro, à crise de insegurança alimentar que é atribuível ao actual contexto geopolítico”.
Adianta que a aceleração da implementação da ZCLCA não será apenas no contexto da conclusão do estabelecimento da construção jurídica, será também na aceleração do acesso comercialmente significativo a novos mercados em todo o mercado da ZCLCA.
Objectivamente o desafio está lançado!
* Paulo de Jesus, advogado, jornalista, agente de futebol registado na FIFA e consultor em negócios internacionais ligados à África. É doutorando em Administração Pública e tem um mestrado em Gestão de Políticas Públicas; licenciado em Direito e em Ciências Políticas/Relações Internacionais. Entre outras especializações, é ainda pós-graduado em Contratação Pública e em Direito Desportivo.
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